Blogue complementar ao Direito na Sociedade da Informação LEFIS
"A Internet foi crescendo de uma maneira informal. E foi também sem muitas formalidades que foi sendo gerida, até à criação do ICANN (Internet Corporation for Assigned Names and Numbers), a entidade que hoje é responsável pela gestão dos endereços de IP e pelo registo dos endereços globais, como os que terminam em .org, .com ou .net. É sobretudo o papel do ICANN que está em causa quando se debate a governação da Internet.
Nas origens da Internet está um projecto financiado pelo Departamento de Defesa norte-americano. Mais tarde, os operadores comerciais começaram a ganhar peso, mas alguns aspectos da Internet continuaram a ser geridos pelo governo dos EUA, o que acabou por levar à criação do ICANN, em 1998.
A antecessora do ICANN fora a Internet Assigned Numbers Authority (IANA), dirigida por Jon Postel. Na altura, sempre que alguém de um país pretendia ter o seu código de duas letras - como .pt, no caso de Portugal - contactava Jon Postel e passava a gerir o registo de domínios com esse código. Era tudo muito informal, explica Pedro Veiga, presidente da Fundação para a Computação Científica Nacional, a entidade que gere o registo de domínios portugueses.
Em 1990, quando o domínio .pt foi criado, Pedro Veiga, enquanto professor universitário, juntamente com um grupo de colegas, contactou Jon Postel. Depois de algumas mensagens para avaliar a capacidade do grupo para gerir o domínio .pt, este foi atribuído. Com um processo tão rudimentar, terão sido cometidos erros e alguns domínios foram atribuídos a quem não tinha capacidade ou legitimidade para os gerir.
O ICANN foi então criado, e ficou decidido que, numa fase transitória, desempenharia as suas funções ao abrigo de um acordo com o Departamento de Comércio dos EUA, que financiara a IANA. "Os estatutos evoluíram entretanto, mas não como se supunha. O acordo com o Departamento de Comércio tem sido renovado e há ainda uma dependência muito grande", explica Pedro Veiga. Por outro lado, o ICANN não deixa de ser uma empresa, com sede na Califórnia, e tem sido questionada a legitimidade de uma empresa gerir a Internet.
Além disso, há um aspecto técnico que também leva à discussão de quem governa, ou não, a Internet. É que, para assegurar a interligação entre os servidores de cada país - na FCCN, por exemplo, existe um servidor primário para a gestão dos domínios .pt -, foi instalado um conjunto de 13 computadores, chamados root servers. Esses equipamentos são fundamentais, pois encaminham os pedidos feitos pelos cibernautas. Actualmente, são geridos por organizações díspares, desde universidades a empresas, passando pelo governo dos EUA.
O dilema é hoje entre duas teses: uma considera que não há problema em ter os equipamentos essenciais para o funcionamento da Internet na mão de privados. Outra defende que, se algo falhar, os governos serão responsabilizados e, portanto, também deveriam ter um papel activo na gestão." (Isabel Gorjão Santos - Público, 16/11/2005)