Blogue complementar ao Direito na Sociedade da Informação LEFIS
"[...] Os atentados de Londres, como antes os de Madrid em 2004 e os de Nova Iorque em 2001, levaram ontem os ministros da Justiça e Administração Interna da União Europeia (UE) a reunir-se de emergência em Bruxelas para renovar as promessas de intensificação do combate ao terrorismo.
O principal progresso de uma reunião que durou pouco mais de três horas assentou no compromisso assumido pelos Vinte e Cinco de aprovar, até ao fim do ano, uma decisão-quadro europeia em matéria de retenção de dados das comunicações telefónicas e electrónicas. A medida obrigará as companhias telefónicas e de fornecimento de serviços de acesso à Internet a guardar durante pelo menos um ano todas as informações relativamente aos autores e destinatários das comunicações por telefone fixo e móvel, sms, ou correio electrónico, bem como a data, hora, duração e local em que são efectuadas. A única coisa que não será retida é o conteúdo das comunicações em si, como reconheceu, aliás, o ministro português da Justiça, Alberto Costa.
Vários ministros sublinharam a importância 'capital' que este tipo de informações tem desempenhado na prisão de dezenas de suspeitos em toda a Europa, como ficou provado nas investigações sobre os atentados de Madrid de 11 de Março de 2004.
Esta medida, que já constava do plano de acção contra o terrorismo decidido pela UE precisamente depois dos atentados de Madrid, e tem sido firmemente defendida pelo Reino Unido, França, Irlanda e Suécia, tem esbarrado no entanto sistematicamente num diferendo entre as instituições comunitárias. A Comissão Europeia, que tem o poder de apresentar as propostas legislativas, pretendia tratar a questão ao abrigo da legislação relativa ao mercado interno, o que pressupõe um processo de decisão conjuntoentre o conselho de ministros e o Parlamento Europeu (PE).
Eurodeputados opõem-se
Os eurodeputados, que apoiam a abordagem da Comissão, não escondem, por seu lado, as resistências ao conteúdo da medida, argumentando com os custos que acarretará para as empresas de comunicações e com preocupações ligadas à protecção da privacidade e das liberdades civis. Esta posição ficou, aliás, bem expressa numa resolução política não vinculativa aprovada pelo PE há menos de um mês.
Mas, depois dos atentados de 7 de Julho em Londres, que provocaram pelo menos 52 mortos e 700 feridos, o ministro britânico da Administração Interna, Charles Clarke, cujo país preside à UE por um mero acaso de calendário, intensificou a pressão sobre os seus homólogos. 'Eu respondo [aos argumentos do PE] que a possibilidade de os cidadãos europeus irem trabalhar nos seus transportes públicos sem irem pelos ares e serem objecto de ataques terroristas constitui uma liberdade civil fundamental.'
'O que é caro é ter vítimas inocentes, não é investir em tecnologia para podermos ter respostas concretas', corroborou o seu homólogo francês, Nicolas Sarkozy.
Na mesma linha, o ministro português da Justiça, Alberto Costa, considerou que o terrorismo tem 'custos fantásticos' em termos de vidas humanas.
Na prática, a medida ontem acordada reduz de forma drástica a intervenção do PE, pelo facto de se tratar de uma decisão-quadro em vez de uma directiva, na qual os eurodeputados não têm interferência.
Durão Barroso, presidente da Comissão Europeia, e Franco Frattini, comissário europeu responsável pelas questões da Justiça e Assuntos Internos, assumiram por seu lado ontem o compromisso de apresentar a devida proposta legislativa em Setembro para aprovação dos ministros em Novembro. Além disso, precisou Frattini, a proposta será acompanhada de um pacote de acções destinadas a garantir a protecção da privacidade.
As medidas aprovadas
As medidas que os ministros decidiram aprovar até ao fim do ano incluem a [...] introdução de dados biométricos (impressões digitais e íris dos olhos) nos passaportes e bilhetes de identidade, [...].
Tal como como reconheceu o ministro britânico, nenhuma destas medidas é nova. 'Mas devemos acelerar o nosso trabalho para aplicar as medidas necessárias de modo a tornar o trabalho dos terroristas mais difícil', sublinhou.
O seu homólogo português, António Costa, reconheceu, aliás, que muitas das medidas que estiveram em discussão já estavam na mesa do conselho quando exerceu o cargo de ministro da Justiça dos governos de António Guterres, entre 2000 e 2002. 'Choca-me regressar cá em 2005 e muitas matérias que estavam em agenda continuarem em agenda', afirmou. E, frisou, a reunião de ontem permitiu, 'mais do que inventar novas medidas' tratar de 'implementar e acelerar' as que já estão na mesa. [...]" (Isabel Arriaga e Cunha -
Público, 14/07/2005)